quinta-feira, 29 de março de 2007

Calça jeans

Ninguém entendia nada. Aquele alvoroço nas proximidades. Dezenas, depois centenas, e logo depois milhares de pessoas focavam seus olhares para aquele pedestal dourado que tinha surgido no centro de São Paulo da noite pro dia.

"Aquela que vestir essa calça jeans será a nova Rainha da Cocada Preta. Com direito a paparazzo, noivo jogador de futebol, plástica no nariz e tudo!"

Ninguém entendia nada! Só podia ser brincadeira. Repórteres chegaram para cobrir os fatos. Não demorou muito até que a primeira mulher se arriscou, subiu no pedestal e baixou as calças. Fez força, encolheu a barriga e nada. Desistiu. Veio a segunda, a terceira, e daí em diante. Magrelas, gordinhas, altas, baixas, ancas largas, cadeirudas e bundinhas murchas. Os homens ao redor faziam o maior rebuliço, afinal, cada tentativa era uma bunda de fora, coisa que não se vê com freqüência na Praça da Sé.

Todas tentaram mas nenhuma conseguiu. Mulheres viajavam de todos os estados para tentar vestir a fantástica calça - e aproveitar e dar uma passadinha na 25 de março. O tempo passou e o poder mágico do misterioso jeans, que nunca foi revelado, caiu no esquecimento.

Hoje a calça é vendida na Daslu por R$7500, em até duas vezes.

segunda-feira, 26 de março de 2007

Isso é só nosso...

Nunca aconteceu
você e eu
ninguém viveu
e todo mundo perdeu
É o mais fácil de entender
mas não o que deve ser

Me ajuda, me abraça
sem medo, sem pressa
me chame, me peça
com jeito, com graça

A gente se quer e se gosta tanto
A gente não quer cada um no seu canto
Iria tão longe
seria perfeito
Você fazendo manha daquele teu jeito
A gente rindo de algo que eu tivesse feito
Eu com teu rosto descansando no meu peito
Vivendo esse sonho, aumentando nosso encanto...

Na hora de dormir, penso sozinho
e é simples entender tanto desejo
é uma delícia amar o teu carinho
e nada é mais gostoso que teu beijo

Pra mim é tudo tão claro, tão certo
Sentir tua alma de dentro, de perto
Matar a vontade mais forte que fome
Pois o vento que trouxe
teu cheiro tão doce
por mais forte ou furioso que fosse
O vento, ainda, sopra teu nome

domingo, 25 de março de 2007

Bate papo com o leitor

Apesar de não ser meu costume escrever textos diretos aos leitores, resolvi abrir uma exceção. Hoje fui colocar um texto novo no blog e parei pra pensar sobre quem são as pessoas que param para lê-lo. Sei que meu amigos mais próximo o lêem direto - ou sofrem as consequências - mas algumas pessoas que sequer conheço têm lido e comentado. Quem são vocês?

Pra ler um texto de um completo desconhecido na internet, parto do princípio de que você é, pelo menos, eclético. Adora novidades. Muitas vezes deve passar pela sua cabeça que que nada bom vem sendo produzido no mundo atualmente, não é? A produção musical, a cinematográfica - nem vou mencionar a televisão - todas elas vem caindo de qualidade. Sem falar na indústria pop que não precisou nem de meio século para ir de Beatles a Punk-Rock sem palavrão. Eu entro em desespero às vezes, em busca por algo bom e contemporâneo, e confesso que está difícil. E você, passa por isso?

Você tem um sonho maluco, que considera impossível, mas que tá sempre ali, te rodeando, te atiçando com possibilidades? Mas e o medo de arriscar, né? Não sei quantos de vocês têm medo de arriscar e quantos não, mas eu não acho que uma opção é mais certa ou nobre do que a outra. Existem pessoas que gostam de se arriscar, outras que não, e todas podem sentir coisas intensas, porém diferentes. Detesto aquele discurso de que todo mundo deve arriscar na vida pra vida ter graça, apesar de ter arriscado muito. Se você arrisca, deve ter um noção de limite parecida com a minha. Eu acho que toda vez que um ser humano é levado ao seu extremo, ao seu limite - seja de ódio, amor, exaustão, cansaço, dor, desejo, tesão, entorpecentes, bebedeira - ele aprende algo importante. Os que não aprendem geralmente se perdem na vida.

Acho que você é uma pessoa ligada em signo mas nem tanto. Gosta de coisas simples e de viajar, não? Tem vontade de conhecer o mundo. Aposto que você tem uma linguagem com seus amigos mais próximos que só vocês entendem e acham graça - e muitas vezes fazem papéis de louco por isso. Música, não sei do que você gosta, mas é intenso. Da música que você gosta, você gosta pra caralho, não é? É a melhor coisa do mundo! E tenho quase certeza que você tem um CD preferido pra uma pessoa preferida. Você repudia preconceito e deve ter uma visão bem peculiar quando o assunto é religião.

É isso, mais ou menos, que eu penso de você, leitor. É pra você que eu escrevo. E só o faço porque acho que tenho algo pra te dizer, algo que possa te fazer rir, se emocionar, pensar de uma maneira diferente, refletir sobre algum valor, enfim, algo que venha a acrescentar. Gostaria de conversar na mesa de um boteco com cada um de vocês, mas infelizmente ainda não posso. Enquanto isso seguimos a conversa dessa maneira, pode ser?

Aliás, deixo aqui meu MSN. Adoraria conhecê-lo:
oh_yeah_br@yahoo.com.br


Abraço!

sexta-feira, 23 de março de 2007

Brincadeira de criança

- Ai Bob, adoro quando você me beija desse jeito.

- Você é uma delícia minha Barbiezinha. Vem cá, vem! Hmmmmm

- Ai, calma, assim eu fico sem jeito.

- Sem jeito nada, vem cá sua gostosa. Tira a blusinha, assim.

- O pescoço não. Dá arrepios. Hi hi hi.

- Isso, isso. Agora tira essa sainha. Isso, que gostosa.

- Agora é minha vez. Deixa eu tirar essas calças.

- Tira, tira tudo. Vai, cai de boca. Assim que eu gosto, Vai.

- Hmmmgrrhffm.

- Que foi querida, não entendi?

- Seu pau é uma delícia.

- Então continua vai.

- Agora me põe de quatro. Isso. Vai.

A baixaria continuou. Maria Luiza ficou horrorizada ao ver sua filha nessa cena. Algo devia estar errado. Não podia ser normal uma criança de 10 anos brincar de bonecas desse jeito.

quarta-feira, 21 de março de 2007

Liberdade de Imprensa

Um terrível acidente na Avenida Paulista. Um ônibus se chocou contra um carro, no cruzamento com a rua Pamplona, ferindo 6 passageiros e, infelizmente, matando as 2 mulheres e as 4 crianças que estavam no Celta. Nossa repórter Kelly Kristina tem mais informações.

- É isso mesmo, Paula. Um acidente TERRÍVEL, TRÁGICO acidente aconteceu há pouco mais de uma hora aqui no coração da cidade de São Paulo. Os feridos já foram levados para hospitais da região, mas os corpos das vítimas fatais permanecem presos nas ferragens. Encontramos 2 homens que parecem ser os respectivos maridos e pais das vítimas e vamos tentar falar com eles.

A câmera focaliza dois executivos, de terno, um com cerca de 40 anos, cabelo grisalho, um pouco mais alto que o outro que aparenta uns 28, 30 anos. Eles se abraçam, o mais novo soluça e chora no ombro do mais velho que não esboça reação, apenas observa o carro retorcido, reduzido a pedaços de metal sem forma.

- Boa tarde senhor. O senhor conhecia as vítimas? A repórter aproxima o microfone dos dois, chamando a câmera.

Nenhum deles reage. O mais novo tenta formular palavras de desabafo, em meio ao seu pranto, mas nada se articula. "Close nele".

- Tivemos informações de que as vítimas seriam suas mulheres e filhos. Isso é verdade? - Pergunta ela aos dois.

O mais novo cai de joelhos em pleno asfalto, transtornado. Leva as mãos ao rosto, se desespera. O mais velho continua impávido. Policiais tentam dispersar a multidão de curiosos. "Esquece o tumulto, foca no chorão ali" Kelly sussurra para o câmera.

- Kelly, você já sabe as causas do acidente?

- Ainda não Paula, mas sei sim que a DOR que esses homens devem estar sentindo é sem precedentes. Acabam de perder as mulheres e os filhos. PERDERAM SUAS FAMÍLIAS NESSE INFELIZ ACIDENTE. Vamos tentar um depoimento. ESPERA, ESPERA, parece que temos um sobrevivente.

Ambos dirigem-se para perto do carro onde conseguem ouvir uma criança chorando. É impossível vê-la devido a posição do carro, de ponta-cabeça amassado contra a parede de uma banca de jornal.

- Parece ser um garoto, vamos tentar nos aproximar.

"Julian, é você? Aqui é o papai! Vai ficar tudo bem! Você tá bem?" grita o mais novo, buscando espaço entre as ferragens para tentar visualizar o garoto. O mais velho continua mudo. A criança grita de dor, chora muito. Diz que não consegue se mexer e sangra muito. Cada frase da criança é repetida pela repórter, incrivelmente, com mais dramaticidade ainda. Até que, finalmente, a criança não reage mais. O pai esmurra o carro gritando pelo seu filho até que os policiais o afastam.

- É muita emoção aqui Paula. Vamos tentar novamente conversar com o pai da criança. Senhor, como é ouvir os últimos GRITOS de SOCORRO de seu PRÓPRIO FILHO e dar toda SUA FAMÍLIA como MORTA numa manhã normal de segunda-feira?

O mais novo sequer percebe a presença da repórter. O mais velho, agora sim, reage, e desfere um soco no queixo da repórter que a nocauteia instantâneamente. A última imagem gerada do local do acidente é algo parecido com alguém pegando a câmera e jogando-a no chão.

Paula, surpresa com a interrupção da matéria, quase pega de surpresa pela câmera, em tom melancólico: "É.. realmente é muito triste que hoje em dia, depois de tantas lutas para um país mais justo, a liberdade de imprensa ainda receba repressões como essa. Aquilo não é um homem, e sim mais um monstro que freia e distorce a democracia e seus princípios. Esse foi o Jornalismo Já. Tenham uma boa tarde".


domingo, 18 de março de 2007

Os caminhos de hoje

Andando nesse meio
e sofrendo de azia
espero, anseio
por menos hipocrisia
de quem antes sorria
e hoje, sem freio
só faz devaneio
e só tripudia,
achando alegria
na dor do alheio.
Aflito, bloqueio -
me assusa a distopia -
e ouço a sinfonia
desse caminho tão feio.
Mas bem que eu queria
ir sem fantasia,
sem muito rodeio
e mais euforia.
É o que eu escolheria,
mas sigo minha via,
com o saco bem cheio
de gente vazia.


sábado, 17 de março de 2007

Pra quem só quer o belo

Trapos viram bonecas
Quando o alvo
só é beleza.
Noites em claro são lindas,
é aceita qualquer tristeza.
E nada lhe traz clareza
quando um "oi" vem só nos lábios,
sem som,
ou um aceno discreto
de longe
satisfaz uma eternidade de frieza.

quinta-feira, 15 de março de 2007

Escada rolante

- E agora vamos para o Shopping Center Gabiru onde, segundo fomos informados, uma escada rolante parou de funcionar. É isso mesmo Ana?

- É isso mesmo Jorge. Como vocês podem ver a escada rolante que dá acesso à praça de alimentação do Shopping Gabiru parou de funcionar. No momento estão na escada rolante 28 pessoas. A equipe técnica já foi acionada, mas não há previsão para o reparo. Bombeiros estão a caminho. Vamos chegar mais perto e acompanhar o drama dessas pessoas.

- Como é? Vai funcionar ou não?

- Vâmo logo aê!

- Tô com fome, manhê.

- Calma meu filho, já já o moço vem pra consertar a escada.

- Eu preciso comprar meu remédio...

- Como você pode ver Jorge o clima é muito tenso aqui no Shopping Gabiru. Crianças, idosos, ninguém foi poupado desse terrível incidente. Os bombeiros chegaram! Vamos lá acompanhar.

Três bombeiros se aproximam do chefe da administração do Shopping a poucos metros da escada. Conversam por alguns segundos, até que o chefe da equipe pergunta:

- Tá, mas porque vocês não sobem a escada? Ou descem?

Em coro as vozes respondem com indgnação: Nunca! Nem morto! Andar? Eu? Que absurdo! Só pode estar louco mesmo! Pirou! Um bebê começa a chorar. Um velho de 60 e poucos anos titubeia com a mão no peito reclamando do seu remédio pro coração.

- Gente, mas são só alguns degraus. Olha aqui minha senhora - diz cutucando a primeira da escada - eu posso até encostar na senhora. Porque não desce?

- Nem morta! A gente já paga uma fortuna de estacionamento, nas lojas, pra comer, o mínimo que esse shopping deve ter é uma escada rolante que funcione. Ao terminar seu ponto de vista, em voz bem alta, de olho na câmera, é ovacionada pelos seus colegas de drama. O administrador interrompe:

- Acabamos de receber um telefonema da equipe técnica. Eles só poderão vir amanhã. Creio que os senhores terão que andar mesm(!). Antes que pudesse terminar seu pronunciamento, os gritos de "Meu remédio! Meu remé..." interromperam-no. O velho que clamava pelas pílulas que acalmariam sua angústia, tenta se reclinar no corrimão, perde o equilíbrio e despenca para a morte certa, 4 andares abaixo. Sua provável esposa, ao ver a cena, se atira.

- Como você pode ver Jorge, o desespero tomou conta dessas pessoas. Sem perspectiva de saírem da escada ainda hoje, dois já cometeram suicídio. Quando será que as autoridades irão intervir? Precisaremos de mais vítimas?

Nesse instante o mesmo garoto começa a gritar de fome, com raiva. Seu urro de descontentamento toma conta de todo o shopping center. Irritado, um homem a sua frente grita para que cale a boca. Sua mãe intervém e diz para o homem tomar conta da sua vida. Uma mulher abaixo reage empurrando a mãe da criança ordenando que cale a boca do seu filho. A briga toma proporções generalizadas. Todos discutem e gritam uns com os outros. O homem tenta dar um soco na cara da mãe do gordinho morto de fome e erra, atingindo o bebê que essa carregava. O bebê é lançado pra longe da escada, caindo de cabeça no capô do carro que estava em showroom no térreo. "OOOHHH". A mulher se descontrola. Assim, o fervor da luta que se via na escada rolante foi aumentando e, um a um, todos foram caindo, ora acidentalmente, ora arremessados, no primeiro piso do shopping. As pessoas olhavam perplexas. Sobrou apenas uma senhora, arranhada e assustada, sentada com medo na escada rolante, após 12 minutos de atrocidades.

No dia seguinte, com a chegada da equipe técnica, ela foi resgatada.


quarta-feira, 14 de março de 2007

Bárbara Barbie, cantora, atriz, modelo, apresentadora e estúpida

Bárbara Barbie era mais um fenômeno da mídia brasileira do século XXI. E como todos esses fenômenos de mídia tupiniquins sua vida útil foi de um verão.

Começou num Reality Show cheio de gostosas. Elas cantavam e mostravam os peitos. Talvez por escolha popular ou por ter trepado com o sobrinho do diretor do programa ela venceu o desafio. Lançou seu disco de músicas dançantes e dançou de shortinho e top em todos os canais de televisão ruins - com o perdão do pleonasmo.

Mas o sucesso - esse arco-íris sem pote de ouro - uma hora se esvaiu. Bárbara entrou em pânico. Nenhum produtor a convidava mais. Ninguém mais escutava suas músicas. A gravadora se recusara a gravar outro álbum. Seu empresário pediu demissão, levando 85% de todo o lucro de seu espetacular boom. Bárbara ficou arrasada.

Precisava voltar ao estrelato. De qualquer forma. Seguiu a "Cartilha das Celebridades Loiras Gostosas e Fúteis" para tentar um novo sucesso. Foi até o tablado, estudou teatro, fez peças de terceiro escalão, tentou novela na Globo. Não deu. Tentou na Record, nada. Tentou a Bandeirantes, deu com a cara na porta. Quando até o SBT a recusou, ela tentou o outro capítulo da cartilha.

Apresentadora de programa. Infantil, juvenil, imbecil, qualquer coisa. É só falar, sorrir, ser gostosa e conseguir manter-se de pé por algumas horas. Tudo isso ela já sabia fazer! Seria fácil. Arrumou outro empresário e buscou contatos em todas as redes. Nada, nada e nada. Ninguém queria Bárbara Barbie.

Tentou namorar jogador de futebol, ser modelo de passarela, fazer filme pornô (com anal e tudo), por Deus, tentou até o Superpop da Luciana Gimezes. E nada. O mundo virara as costas para Bárbara Barbie. Foi então que teve a mais genial de todas suas idéias. Apareceria pelo menos mais uma vez, triunfante, na glamorosa e tentadora mídia. Atirou-se do décimo quarto andar de um hotel em Copacabana. Seu corpo ficou quase todo moído e desfigurado, mas diziam que seu rosto esboçava um sorriso enorme.

Todo ano agora ela aparece no Gugu.

Com muito medo de mudar

Vivendo de inércia cinza-escura,
observando a vida enquanto dura,
sem beijos, sem carinhos, sem abraços -
difíceis de se ter cruzando os braços -
invento mil maneiras diferentes
pra poder fazer, então, sorrir meus dentes.

Sorrindo assim, sem graça, sem ternura,
sempre de olhar fosco - que amargura -
sem afagos, sem vínculos ou laços,
desenho minha vida em finos traços,
culpando quem um dia foi presente,
com medo do que vem daqui pra frente.

sábado, 10 de março de 2007

(In)Decisões pós-encontro

Ricardo e Ritinha tiveram o encontro perfeito naquela noite. Ele foi tão engraçado, tão gentil, tão romântico. Ela, que mulherão! Que elegância, que charme. O jeito de andar. Ele uma delícia na cama, ela um furacão. "Lindo", "querida", tudo parecia tão normal, tão simples. Que maravilha de noite. Na semana seguinte, consultaram-se com seus melhores amigos, Marcos e Mariana.

- Você acha que eu devo ligar pra ele? Hoje já? Não parece desespero? E se a gente ficar sem assunto? Aquele clima chato? Tenho pavor de clima chato no telefone. Vou parecer uma encalhada, desesperada me jogando pra cima dele. Já dei na segunda, que que ele vai pensar? E se ele ligar? Recebi uma mensagem dele super fofa. Vou responder me abrindro, falando que adorei. Não né? Banco a fria, fazer ele correr atrás um pouquinho né? É, pra dar valor. É melhor. Ah, será que ele vai ligar? Pois é querida, não ligou nem ontem nem hoje. Acho que amanhã ele liga. Foi tão bom. Ligou mas eu tava numa reunião, você acredita? Puxa Mari, já é sexta e nada dele ligar denovo. Que que eu faço? Liguei, deu caixa postal. Eu não, detesto falar em caixa postal. Vou mandar uma mensagem. Ou será que ele vai se assustar? É muita pressão né? Vamos jantar no japonês e a gente conversa mais.

- Marcão, que delícia de mulher. Claro, quero sair com ela denovo. Pensei em ligar hoje já, mas muito em cima, né? Mulher adora um joguinho. Vou ver se ligo amanhã, ou mando uma mensaginha. Mandei, mandei mas ela não respondeu. Tá bancando a difícil. Ou a mensagem não agradou? Será que mandei mal? Meio canastrão ou meio apaixonadinho demais? Vou ligar pra ela e ver qual que é. Chamou, chamou e não atendeu. Certo que não quis me atender. Não devia ter mandado aquela mensagem. Não, não deixei recado. Vou ligar na casa dela. Não, não tava. Agora pareço desesperado, né? Bom, deixei recado, ela viu que eu liguei, mandei mensagem, se quiser ela me liga né? Mais que isso já é forçar a barra. É Marcão, não ligou. Que merda, e eu achando que fosse sossegar ali. Pois é. Vâmo onde hoje?

Se adoraram, foram feitos um pro outro. E nunca mais se viram.

quinta-feira, 8 de março de 2007

Meta a linguagem

Sem idéias pra escrever... busco idéias interessantes... na verdade qualquer idéia serve, interessante ou não... acho que escrevi muito a palavra "idéia" aqui... sem falar das reticências... sempre abuso das reticências...

O papel branco, ou melhor, a tela branca me desafia. Muitos dizem que branco acalma, mas a mim ele perturba, irrita, quase constrange de tanto que intimida. Onde estão as palavras? "Cadê a sacada genial, a poesia romântica, o final surpreendente?" grita ele no meu ouvido com o dedo na minha cara.

"Estou esperando a inspiração" eu respondo, de boca cheia, quase triunfante. Ele ri. Na verdade gargalha. "Inspiração é a desculpa dos que têm medo de tentar" diz ele, áspero, seco. "Se você acha que vai se livrar de mim de braços cruzados esperando por inspiração, acho melhor arrumar um outro sonho pra correr atrás. Escrever não é pra você!" completa, com deboche.

E assim sigo, mais perdido ainda, de dedos atados. Escrever sobre o quê? Será que é possível escrever sem inspiração? Ir jogando as palavras, buscando um sentido no seu próprio desenrolar, no correr dos dedos? Não vai parecer ridículo? Sem graça? Vazio? Acho que preciso me concentrar, é isso. Espairecer a cabeça um pouco, fazer uns polichinelos. Me levanto.

- Resolveu fugir agora? Berra o branco da tela. "Eu sabia, você é um covarde. Acho que nunca poderemos trabalhar juntos" diz em tom paternalista. E segue "É uma pena, achei que você tinha o jeito".

- Mas o que posso fazer se não estou inspirado? Nada vem à cabeça! Não consigo pensar em algo pra escrever.

- Esse é o seu problema. Pára de pensar e escreve. Você quer ser escritor ou intelectual? Se quiser ser escritor, escreva. Escreva bobagens, escreva coisas sem graça, rascunhe. Misture palavras a esmo. Não pense num tema, não pense num começo-meio-fim. Brinque com a forma, com o instrumento. Inspiração é ótima quando vem, espontânea, fazendo com que os dedos corram pelo teclado desinibidos. Mas esperar por ela é a maior armadilha desse negócio. Faça seus dedos trabalhar quando não querem e você irá longe.

- Mas como? Parece que algo me prende, não consigo sequer começar, não sei o que fazer. Preciso de um método, de uma linha a seguir. Um roteiro, sei lá. Uma palavra-chave pelo menos...

- Você não precisa de nada disso. Só precisa calar essa boca e começar a escrever. Aliás, já parou pra pensar que você está discutindo com um computador?

(silêncio estarrecedor)

Credo. Esse negócio tá me deixando maluco. Vou tentar escrever alguma coisa. O quê? Sei lá, que se foda. Qualquer coisa. Mas antes acho melhor parar com isso aqui. Isso, assim, com um ponto final, pra não ter erro. Ou termino com uma pergunta?

quarta-feira, 7 de março de 2007

Primeiro encontro

- Então, daí eu falei pra ele "Você tá maluco! Isso daí não é camarão!"

- Hahahaha... Ai meu Deus... Tô chorando até...

- E ele olhando pra mim com aquela cara... hahaha... Você precisa conhecer esse cara.

- Preciso mesmo... que engraçado...

- Você me dá licença? Vou ao banheiro e já volto.

- Claro, claro.

No caminho para o banheiro Caio ia contente. Tudo ia bem. Kátia era linda, divertida, inteligente. Só faltava o primeiro beijo pra aliviar a tensão. Tensão que começara a trazer gotas de suor para a testa de Caio. Precisava lavar o rosto.

- Você tá indo bem cara! Continua assim!

"Quem disse isso?" perguntou Caio, que até então não percebera a presença de ninguém no banheiro.

- Fui eu! Seu reflexo! Olha pra frente!

Caio, assustado, viu uma figura muito parecida com ele do outro lado do espelho. Um pouco mais forte, mais alto, mais bonito e com mais gel no cabelo. Seu "eu" continuou:

- Tá no papo cara. Volta lá, senta no sofá bem do ladinho dela, e nem diz nada. Já agarra!

- Como cara? Não sou disso.

"Não é mesmo!" disse uma terceira voz. Esse era Caio, um pouco gordo, com um aspecto mais infantil e indefeso. Tinha os ombros caídos como um perdedor nato. "Ela não tá gostando não. Acho que hoje não rola nada".

- Pera lá também. Não rola nada? Nem um beijinho?

- Claro que rola - interveio Caião. Chega agarrando. Chave de braço cara!

- Faz o seguinte - esse novo Caio estava de terno, tinha uma aparência mais madura, costas retas, olhar determinado - Ela está adorando o seu papo. Continua do jeito que tá e presta atenção nos sinais dela.

- Sinais? Isso é pra cabaço! Agarra de uma vez.

- Se eu fosse você ficava na boa. Quem sabe da próxima vez. Não estraga tudo.

- Calma gente, calma. Gostei da dos sinais e da de sentar pertinho. São boas idéias. Mas falta coragem...

- Claro. Culpa desse gordo aí.

- Ei...

- Sem brigas. A gente precisa ajudar nosso chefe aqui senão ninguém leva nada pra casa hoje.

"Já sei, Já sei" gritou uma quarta voz. Era Caio, criança, porém com o mesmo cavanhaque e os mesmos óculos de adulto. Tinhas espinhas no rosto e demonstrava muita energia: "Ela tá adorando o tipo engraçado. Continua com as piadas, faz ela rir. Esse é o segredo."

- Concordo com ele, mas acho que hoje não vai rolar nada.

- Ela mexe no cabelo? Toca no seu braço? Tudo isso quer dizer que ela tá afim.

- Agarra cara! AGARRA!

- Faz ela rir. Elas adoram caras engraçados. Conta a história do camarão!

- Já contei...

- Você tem que ser charmoso, deve dar indiretas, não ir de uma vez - dessa vez era Caio de cabelos compridos e seios quem tomara a palavra. O cavanhaque definitivamente não lhe caía bem, pensou Caio, o original.

E assim foram as dicas, surgindo uma a uma. Caio, fechava os olhos, enxaguava o rosto, e sempre ao abrir os olhos novamente via mais e mais Caios. Uns 3 sentados na pia, um gritando de dentro do box do banheiro, Caios saindo pelas latas de lixo. Todos, um a um, foram formando um único som, confuso, caótico, cheio de fonemas perdidos, cada vez mais alto, cada vez mais perturbador. Só não mais perturbador do que as gotículas salgadas de suor que insistiam em permanecer na testa de Caio, não importasse quantas vezes lavasse seu rosto. As gotas se multiplicavam na medida em que o som das mil vozes tomava conta de todo ambiente. Palpites. Conselhos. Uma idéia mais genial e mais cretina do que a outra. Sufocado e quase sucumbindo ao desespero, Caio ouviu, finalmente, uma voz que o tirou por vez daquele tormento:

- Senhor, nós já estamos fechando.

terça-feira, 6 de março de 2007

O parto de amanhã


- Força querida, força!!!

- UUHHHH... AAHHHH...

- Segura na minha mão! Inspira, expira...

- Unhéééééé

- Parabéns senhor! É um menino lindo!

- Prontinho querida... ufa... obrigado doutor...

- O senhor quer que a gente instale a entrada USB aonde?

- Pode ser no dedinho da mão esquerda...

- Perfeito...

- Alguma tecnologia sem fio?

- Quais que vocês tem aqui?

- As mais populares são o Bluetooth e o Infra-vermelho. Mas como o senhor já está instalando a porta USB, eu consigo fazer um pacote, com preço bom, e instalar o FastConnect. Dá uma olhada nesse panfletinho aqui...

- Querido... tem certeza que isso é uma boa idéia? Ele é tão novinho...

- Fica tranquila querida. Descansa um pouquinho e deixa que eu cuido disso. Esse pacote que você diz já vem com GPS?

- Sim senhor! E ele já sai daqui com um número de celular e tudo. A gente instala o chip na palma da mão, o fone interno no ouvido esquerdo e o microfone no lábio inferior. É esse pacote de baixo aí ó, o InterComPlus. Podem ficar tranquilos que é tudo ISO 9000 com certificado do Inmetro, da Anatel e do Conselho Nacional de Medicina.

- E o disco rígido é de 1 Tera?

- Isso mesmo!

- Então tá certo! Manda bala!

O médico concorda com a cabeça, vai até uma pia no canto da sala e abre uma gaveta. De lá retira uma injeção, a prepara com uma agulha de 8 cm e vai em direção ao recém-nascido. Prepara-se para enfiar a agulha dentro do ouvido do garoto, quando o pai, assustado, intervem:

- Calma aí doutor!!! Que injeção é essa???

- Antivírus...

Soneto do amor... ou da paixão?

E daí se ninguém vai entender?
E daí se ninguém vai aceitar?
Quem sabe? Um jeito novo de amar...
Um jeito mais bonito de viver.

Mas quem disse que eu quero me perder?
Quem falou que eu quero me entregar?
É mais do que absurdo arriscar
O que foi tão difícil pra se ter.

Será fraqueza ter medo da dor?
Será loucura ouvir o coração?
Eu ganho e perco seja onde for...

Talvez valha a pena - Talvez não.
Trocar a solidez do meu amor
pelo desejo ardente da paixão.

quinta-feira, 1 de março de 2007

Vazio

Perdido entre vozes e passos
me fecho, me tranco, me isolo
e sozinho entre seus braços
não quero carinho
e não quero colo

Quieto, tento me ouvir
entender o que tento sentir
mas tudo distrai e confunde
e nada
agrada
essa mente perturbada
que inventa o que está por vir

Um tédio emocional
um marasmo sentimental
Quase uma paralisia
cerebral
que pintam tudo de cinza
deixando o dia a dia
bem mais insosso
que o normal

E nem você nem ninguém
sabe fazer isso
sair de dentro de mim -
talvez nem eu também.
Mas bem lá fundo da alma
Eu torço pra que exista
alguém
que me faça mal ou bem
que venha com amor
ou sem
enfim
desejo ou dor
sem fim
qualquer um é melhor.
Pior mesmo é "viver"
assim

Problema com dinheiro


- Oi amor.

- Oi querida! Quer uma ajuda com essas sacolas?

- Não querido, tudo bem. Chegou carta do banco pra você.

- Deve ser o extrato. Deixa eu ver.

- Tá aqui! Vou guardar essas comprinhas na cozinha. Já venho.

- Ué... que esquisito.

- Que foi querido?

- QUE ESQUISITO!

- O que amor?

- Esse extrato... é do mês que vem!

- Como assim, do mês que vem? Deixa eu ver.

- Olha aqui. Data inicial e data final. Começa daqui duas semanas.

- Credo. Nunca vi isso.

- Nem eu.

- Aliás, o que diabos é "Na moitinha, Motel" onde o senhor gastou 350 reais no cartão?

- E eu vou lá saber? Eu não gastei nada! Nem conheço esse lugar!

- Sei sei! Não gastou mas vai gastar!

- Você tá maluca querida? Discutindo sobre o que nem aconteceu?

- Maluca é? E isso aqui: 400 reais na "Jóia para sua jóia"? Você nunca me comprou nem um par de brincos...

- Que absurdo...

- Você tem outra né? Fala a verdade!

- Meu anjo, pára com isso. Nada disso aqui aconteceu ainda... e aliás..

- Aliás o quê? Heim, seu cachorro?

- Por acaso a senhora pensa em gastar 640 reais na "Chapelaria Madame Zuleika"?

- Eu não... não sei do que você tá falando...

- Ah não é? E isso aqui: "Sapatos e Sapatilhas", 390 reais. Você ficou louca?

- Não levanta a voz pra mim, seu cachorro. Aposto que você não fala assim com a sua vagabunda.

- Eu falo alto com qualquer vagabunda que gastar 680 reais numa jaqueta de couro. Olha isso! Você pensa que eu cago dinheiro?

- Quem me garante que não foi você que comprou essa jaqueta pra sua vagabundinha heim?

- Ah é? E quem é que me garante que não foi você quem foi com seu amantezinho pé-de-chinelo no Na Moitinha, heim?

- Pois fique o senhor sabendo que o Marcelão sempre paga o motel, tá bom?

A situação só piorou. Trocaram tapas, jogaram vasos, "seu lixo", "sua puta". Ele foi dormir fora, ela chorou a noite toda. Acabaram o casamento, nunca mais um olhou o outro no olho. Doze anos juntos, assim, pela janela, por contas que jamais chegaram a existir. Trocaram poucas palavras na audiência de divórcio.

- Fernando?

- O quê?

- Chegou a fatura do cartão de crédito...

Ficou um clima horrível.