segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Bairro Jardim

- Sargento, duas de nossas pipas foram abatidas pelo exército inimigo.

- Qual o paradeiro delas, soldado?

- Estão em rota de queda, senhor! Devem alcançar algum telhado na rua das Cerejeiras!

O bairro Jardim andava em guerra civil desde que o balão da turma do Fumaça tinha sido capturado pelo Capitão Montanha, do quarteirão de cima. "Caiu em nossos domínios, é nosso" pronunciou o Capitão, dando início ao maior banho de sangue já visto na pacata Santo André.

- Isso pede medidas urgentes! Cacá, Juninho, Bolinha, Feio e Ceará, vocês serão o batalhão Skittles! Vocês irão atacar por trás da padaria. Não esqueçam as granadas e os molotoves.

"Sim senhor", disseram todos em coro, menos Juninho. O negócio dele era o AK 47. Era mortal com ele, praticava desde os 4 anos.

- Meleca, Zé Beiço, Gaiato, Lilico e Ganso, formarão o batalhão Chokito! Vocês vão pela concessionária. Atirem em tudo o que demonstrar estar vivo. Precisamos dessas pipas de volta. Já perdemos muitas bolinhas de gude, se essas pipas caírem em mão erradas...

"Sim senhor", gritaram os soldados, prontos para darem suas vidas pelas duas preciosas pipas, que a qualquer momento poderiam cair nos telhados inimigos.

- Comandante, alguém aqui no rádio deseja falar com o senhor. Ele se auto-denomina "O Estranho" e diz que o senhor o conhece.

- É o líder dos mercenários. Os snipers que moram nos prédios. Não tenho nada a tratar com essa gente. Diga pra ele que - Antes que o Comandante Fumaça terminasse sua frase de efeito ele pôde ouvir o que seria o batalhão Chokito dando um grito seco, interrompido pelo som de uma explosão - As Dinamites! Aqueles malditos! E vendo os pedaços de seus fiéis soldados sendo lançados ao céu, tomou o walkie-talkie da mão do Tenente Mancha e disse a contragosto:

- Diz, seu verme.

- Bom, me parece que você acabou de perder cinco menininhas. O Montanha tá acabando contigo...

- O que você quer?

- Vou direto ao assunto. Eu tenho quatro homens espalhados emcima da cabeça de vocês. O Montanha me ofereceu dez caixas de torrone, um freezer cheio de sorvete e dezoito quilos de amendoim. Mas como eu gosto mais de você, preferi ouvir sua contra-proposta antes de tomar partido.

- Quem me garante que você tá falando a verdade?

- Tá vendo seu tenentezinho aí? Fumaça quase pôde ouvir o que fora sussurrado fora do alcance do rádio, mas concluiu rápido o que tinha sido. Em segundos a perna esquerda do Mancha tinha sido estraçalhada por um balaço de algo que só poderia ser um Steyr SSG-69, de fabricação austríaca. "Esse não vai poder jogar bola domingo, hahaha..." completou.

- Seu maldito. Você venceu. Você pode ficar com os chocolates, os chicletes e com metade dos salgadinhos.

- E as irmãs do Bocão! Quero as irmãs do Bocão!

- Tá bom, as irmãs do Bocão!

- É sempre um prazer fazer negócios com você "seu" Fumaça! Agora com licença, vou dar uma ajuda pras tuas menininhas ali perto da padaria. Espero as entregas às 11, e daí terá suas pipas. Pode acompanhar nosso trabalho da laje.

- Você vai seqüestrar as pipas?

- É só a minha promissória, fumacinha. Para o caso de você tentar ser tão sujo quanto realmente é! Câmbio e desligo.

Fumaça de posicionou no telhado de sua casa-bunker e observou tudo com seu binóculos. O batalhão Skittles já tinha perdido dois homens - Um tiro de bazuca vindo do telhado da Dona Marta explodira muito perto de Juninho, que perdeu o braço direito, e Bolinha fora surpreendido por dois pitbulls que mastigaram sem piedade pedaços de seu rosto e tronco, antes que Ceará pudesse dar cabo das feras. Os homens do Montanha se defendiam bem. Havia quatro homens defendendo a entrada da rua pela padaria, porém, em segundos, um a um caíra com tiros disparados pelas janelas dos Condomínios Anchieta e Panorama. Fumaça acompanhava ainda o desfecho da batalha com os olhos atentos quando algo lhe surpreendeu pelas costas. Sua língua sentiu um líquido denso, meio salgado e meio amargo. Era sangue. A facada devia ter atravessado as costelas, chegado ao pulmão talvez. Virou-se e viu Montanha, gargalhando ruidosamente.

- Maldito...

- Fumaça, quem diria, o grande estrategista militar precisa de uma retaguarda melhor. Mandou todos os seus homens e ficou desguarnecido. O que eu poderia esperar de um pivete de 13 anos? - e continuou sua gargalhada por alguns segundos, tempo em que Fumaça, quase sem forças, tirou do coturno seu fiel 38, que a esta altura da batalha só tinha uma única bala. Disparou contra Montanha atingindo seu rosto de raspão, rasgando seu olho direito. Urros de dor ecoaram pela rua das Cerejeiras. Fumaça reuniu o que ainda lhe restava de energia, arrancou a faca das próprias costas e voou em direção de Montanha. Eles caíram da laje para o quintal e lutaram como se o destino do mundo dependesse disso, até uma voz, algo supremo, algo que transcendia a força dos dois exércitos, intervir na batalha:

- Luquinhas e Serginho! Já pra dentro os dois!

2 comentários:

Wagner disse...

hauahua gostei

a história se desenrolou como um desenho animado, em minha imaginação

abraços

Diogo Melo disse...

Nunca tinha pensado num "Deus Ex Machina" em forma de mãe... Extremamente propício, não tinha como terminar de outro jeito... é o típico "E o resto se escreve sozinho"