sábado, 7 de fevereiro de 2009

Boa ação

A desigualdade social nos apresenta contrastes radicais em diversos lugares e em curtos espaços de tempo. Favelas rodeando bairros da alta sociedade tornaram-se um exemplo até já banalizado desse tipo de ocorrência, assim como os mendigos que vivem nas ruas do Jardins em São Paulo, vizinhos de grandes prédios comerciais e apartamentos medidos em hectares.

Esse tipo de situação causa estranheza nas duas partes, seja por nojo ou por inveja. Raramente se vê uma interação entre esses dois universos - tão próximos e tão distantes - que não tenha um vidro de carro como mediador ou uma moeda como propósito. Mas, às vezes, algo sublime, uma quebra de paradigmas radical, pode ocorrer no desenrolar do dia-a-dia de qualquer um.

Como o caso da Joana, uma menina de rua que fugiu de casa por abusos do pai e surras da mãe. Mora na rua há alguns anos já. Vive de esmolas pois não confia nos abrigos da prefeitura, com medo de mais abusos de qualquer ser humano que compartilhe o mesmo espaço com ela por mais de 30 minutos. Assim, destinada à solidão, ela vivia seus dias na capital paulista até que numa noite em que não conseguia dormir, como providência divina, um filhote de vira-lata, meio misturado com beagle, cruzou o seu caminho, passando por entre os papelões onde dormia, em higienópolis. Mesmo sem ter o que botar na própria boca, a garota acolheu o filhote como um filho, simplesmente por encontrar naquela criatura indefesa o que de mais belo havia passado por sua existência. Passou a criá-lo desde então.

Mas sua vida mudou numa tarde, pouco depois do almoço. Ela e seu companheiro dormiam sob a sombra de uma árvore, próximos ao cemitério da Consolação. Um carro de luxo, daqueles blindados e possantes, parou num farol próximo ao santuário de Joana e do seu tesouro. Viu ambos dormindo. Estavam esquálidos e sujos, ela mais magra do que ele. Comovido pela cena, o homem encostou seu carro no meio-fio, desceu e aproximou-se. Teve a impressão de que sonhavam fundo, um sono pesado demais para se ter naquele ambiente. Tomou uma decisão que mudaria a vida de Joana para sempre. Chegando devagar para não assustá-los, pegou o filhote que dormia próximo aos braços de sua ama e levou-o consigo.

Ainda no carro, mudando sua rota para um veterinário, suspirou satisfeito pela sua atitude nobre e acariciou o bicho que ainda dormia.

- Tadinho...